As atividades industriais e econômicas adicionaram ao oceano o equivalente energético de quase dois bilhões de bombas atômicas como a que foi lançada sobre Hiroshima desde a assinatura do Acordo de Paris. O conteúdo de calor do oceano em 2025 (até uma profundidade de 2000 metros) era cerca de 104 zettajoules maior do que em 2015 — o que equivale a aproximadamente 1,7 bilhão de bombas atômicas como as lançadas sobre Hiroshima em 1945 (cerca de cinco bombas por segundo).
A média diária global de gelo marinho atingiu um mínimo histórico em fevereiro de 2025. A extensão e o volume máximos do gelo marinho, tanto em 2023 quanto em 2024, também ficaram dramaticamente abaixo dos níveis dos anos anteriores.
O gelo marinho da Antártica pode ter entrado em um novo estado, consideravelmente menor, já que as extensões máximas de inverno em 2023 e 2024 ficaram muito aquém das registradas anteriormente. Em 2025, a extensão do gelo antártico também segue muito abaixo das médias históricas em termos de extensão e volume. As extensões mínimas de verão do gelo antártico de 2022 a 2025 foram as menores da história, cerca de metade da média histórica, e o valor mínimo registrado em 2023 foi calculado como algo que só ocorreria uma vez a cada 2650 anos sem mudança climática. O gelo do Ártico atingiu seu volume mais baixo já registrado em março de 2025, após décadas de declínio.
O nível do mar atingiu um recorde histórico em 2024 — e a taxa de elevação aumentou desde 2015. A reversão da elevação do nível do mar levaria centenas ou até milhares de anos, mesmo que começássemos agora.
Na média os oceanos vêm se tornando mais ácidos de forma constante e a taxas que não eram observadas há pelo menos 26.000 anos. Em média, os oceanos estão cerca de 4% mais ácidos do que em 2015. Em 2024, o “Planetary Health Check” do Instituto de Potsdam alertou que a acidez dos oceanos pode se tornar em breve o sétimo limite planetário a ser ultrapassado.
As temperaturas médias da superfície do mar atingiram um recorde histórico em 2024, ficando 0,84°C acima da média para a época do ano, superando o recorde anterior de 2023. As temperaturas médias da superfície do mar em 2023, 2024 e 2025 ficaram nitidamente acima dos anos anteriores. O oceano absorveu cerca de 90% do calor extra produzido pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento — mas sua capacidade de continuar absorvendo esse calor está diminuindo, o que faz com que mais calor permaneça na superfície.
Houve quase 3,5 vezes mais dias de ondas de calor marinhas nos verões de 2023 e 2024 do que a média histórica. Também ocorreram ondas de calor extremas e recordes em 2022. Metade das ondas de calor marinhas desde 2000 não teria ocorrido sem o aquecimento global, e essas ondas de calor hoje duram três vezes mais do que em 1940.
As ondas de calor marinhas causaram devastação nos últimos dez anos. Uma onda de calor marinha entre 2013 e 2016, apelidada de “The Blob”, provocou a morte por inanição de milhares de filhotes de leão-marinho na Califórnia, matou quatro milhões de airos ou murres-comuns (aves marinhas), e provavelmente causou uma redução de 34% na população de baleias-jubarte no Havaí. A onda de calor marinha no noroeste do Pacífico em 2021 causou perdas recordes de US$ 8,19 milhões para a pesca japonesa. As ondas de calor marinhas de 2023-2024 fecharam as pescarias de anchova no Peru, com perdas estimadas em US$ 1,4 bilhão; alimentaram a Tempestade Daniel — a inundação mais mortal da história da África, com até 10.000 mortos — e causaram mortes em massa de peixes e moluscos em todo o mundo.
O aquecimento dos oceanos e as ondas de calor marinhas causaram branqueamento de corais sem precedentes. Durante o primeiro evento global de branqueamento de corais em 1998, 21% dos recifes sofreram estresse térmico suficiente para causar branqueamento — no terceiro evento, entre 2014 e 2017, esse número foi de 68%. De 2023 a 2025, o branqueamento já afetou 84% dos recifes do mundo (e ainda está em curso), e a intensidade deste evento foi tão severa que a NOAA adicionou três novos níveis (Níveis 3 a 5) à sua Escala de Alerta de Branqueamento para refletir a maior proporção de corais morrendo.
Por fim, há ainda o impacto direto da indústria do petróleo, que está expandindo sua atuação offshore. Esse avanço agrava a contaminação das águas, ameaçando a biodiversidade marinha e os modos de vida que dependem do oceano. No Brasil, os riscos já são evidentes: em 2024, foram registrados mais de 700 acidentes na exploração de petróleo no mar – o maior número da série histórica –, além de 1.375 quase-acidentes, muitos deles em instalações de produção e sondas offshore. Mesmo assim, o governo e a Petrobras seguem pressionando pela abertura de novas áreas sensíveis, como a foz do Amazonas.
Comentários de cientistas sobre este briefing:
Prof. Alex Sen Gupta, Universidade de New South Wales, Sydney, Austrália
“Na última década, medimos um adicional de 104 zettajoules entrando e aquecendo o sistema climático — isso são 104 mil milhões de milhões de milhões de joules de energia. Mas o que isso significa? Para comparação, a bomba de Hiroshima liberou 63 milhões de milhões de joules. Comparando esses dois números, o aquecimento global nos últimos 10 anos equivale a cerca de 1,7 bilhão de explosões atômicas, ou, se dividirmos pelo número de segundos em 10 anos, equivale a cerca de 5 explosões atômicas por segundo. Claramente isso está afetando os oceanos — está fazendo o nível do mar subir, os sistemas de gelo derreterem e a atmosfera e os oceanos aquecerem. Esse último fator significa um aumento das ondas de calor marinhas e toda a devastação que elas causam. Toda essa energia vem da ação humana, ao colocar mais e mais gases de efeito estufa na atmosfera. Isso precisa parar.”
Dra. Kathryn E. Smith, Associação Biológica Marinha do Reino Unido
“Minha pesquisa recente mostrou que as ondas de calor marinhas causaram impactos severos globalmente nos últimos anos. Vimos mais colapsos de pescarias, eventos de mortalidade em massa e danos a ecossistemas. Os oceanos aquecidos também alimentaram tempestades em terra, gerando bilhões de dólares em prejuízos e milhares de mortes. Todos esses impactos ocorreram antes mesmo de atingirmos o limite de 1,5°C. Uma década após o Acordo de Paris, é ainda mais importante evitar que esses limites sejam ultrapassados. A vasta maioria dos impactos nos oceanos que observamos na última década são resultado direto das mudanças climáticas causadas por humanos. A escalada dos impactos é, francamente, chocante — e sem a redução das emissões e do uso de combustíveis fósseis, só vai piorar nos próximos anos.”
Dra. Karen Filbee-Dexter, Universidade da Austrália Ocidental
“A mudança climática está empurrando nosso oceano para um território desconhecido, provocando colapsos e danos irreparáveis a muitos ecossistemas e espécies marinhas valiosas. O mais preocupante é que nossas emissões já nos condenaram a impactos que serão sentidos por gerações.”
Dra. Jennifer Francis, Centro de Pesquisa Climática Woodwell, revisora científica do relatório State of the Cryosphere da ICCI
“O gelo marinho do Ártico é um dos maiores indicadores das mudanças climáticas causadas pelo ser humano. Existindo próximo ao ponto de congelamento da água salgada, o gelo derrete com um leve aquecimento — e esse derretimento é acelerado por um ciclo vicioso de aquecimento-derretimento-mais aquecimento. Satélites documentam esse declínio desde a década de 1970. Durante o verão, a área coberta pelo gelo diminuiu quase pela metade e seu volume em cerca de três quartos em menos de uma vida humana. Na última década, a cobertura de gelo extremamente fina tornou-se altamente vulnerável a ventos, correntes oceânicas, surtos de calor vindos do sul e períodos ensolarados. Durante esses anos, sua extensão passou a oscilar mais intensamente, com recordes mínimos diários sendo quebrados rotineiramente.
A perda de gelo significa que navios agora podem navegar com mais liberdade em rotas polares, trazendo benefícios econômicos, mas riscos maiores de vazamentos de combustível. Áreas maiores de água aberta permitem a proliferação anormal de algas marinhas em locais e épocas inusitados, afetando a delicada teia alimentar marinha. As grandes plataformas de gelo, que antes serviam de berçário e área de caça para mamíferos marinhos, estão cada vez mais escassas. E os povos que dependiam do gelo para transporte e práticas tradicionais de pesca e caça precisam mudar suas formas de vida.”
Dra. Aimée Slangen, Líder de Pesquisa no Instituto Real de Pesquisas Marinhas da Holanda (NIOZ)
“A taxa de elevação do nível do mar aumentou desde 2015 e sabemos que isso se deve em grande parte às mudanças climáticas causadas por humanos. Ao contrário de outros fenômenos, como a temperatura, as mudanças no nível do mar ocorrem relativamente devagar — mas aumentos adicionais já estão assegurados e se tornarão visíveis nos próximos anos e décadas. A elevação do nível do mar é importante porque ameaça populações humanas e ecossistemas costeiros, agrava as tempestades e leva a mais erosão costeira.”
(Com Cinthia Leone/Climainfo)