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Belizário Galeria recebe mostra de Reynaldo Candia

São Paulo, por Kleber Patricio

Reynaldo Candia – “Alvorada Construção” – 2022 – gravação sobre concreto – 40 x 30 cm.

“Oh! O concreto já rachou! Rachou! Rachou! Rachou!
O concreto já rachou!
Brasília…
Brasília…
Brasília!”
Plebe Rude

A Belizário Galeria abre a mostra “O concreto já rachou!”, de Reynaldo Candia, artista paulistano que criou 35 obras inéditas para contar a história não mostrada sobre a construção de um sonho. Não um sonho pessoal do artista e sim uma ideia que foi apresentada a uma nação sobre o “País do Futuro” com sua “Capital da Esperança”. O texto crítico é de Divino Sobral.

“A mostra ‘O concreto já rachou!’ busca seu título em um verso da letra da música ‘Brasília’ (1985), gravado pela banda brasiliense Plebe Rude em seu disco de estreia, que também tinha esta frase como título”, explica Divino Sobral, que acrescenta: “’Brasília’ parece chamar atenção da cidade para o momento em que o concreto começa a trincar e a rachar, deixando prestes a desabar os pontos frágeis da construção edificada sob o selo da democracia e da liberdade política.(….) Por outro lado, o título leva a pensar também nas fissuras ocorridas na construção do próprio conceito de cidade e de arquitetura moderna, diante das pressões de um país subdesenvolvido”. O concreto, o ferro e a madeira são os principais elementos utilizados pelo artista na construção de seus trabalhos, os quais também são os elementos base de Brasília. Diferente do que possa sugerir o título, em “O concreto já rachou!”, Reynaldo Candia enfatiza prioritariamente a influência dos candangos sobre a execução deste grandioso projeto e resgata a cultura histórica brasileira.

Reynaldo Candia – “A Terra Vermelha”, 2022 – Técnica: madeira, cimento, pigmento e óleo – s/d.

O artista não se posiciona como um crítico ou analista de tempos ou posicionamentos diversos e sim como um historiador que busca o resgate dos personagens sombreados pela redação histórica. Os ‘candangos’ são personagens importantíssimos, uma vez que o olhar de Reynaldo Candia não se furta de observar a realidade humanística das épocas e regiões brasileiras às quais dedica sua pesquisa. Após imersão na região nordeste do Brasil para sua série pregressa, o artista deparou-se com relatos das migrações para o Planalto Central na época da construção da nova capital. Por definição, “candango” é o termo dado aos trabalhadores que migraram à futura capital para sua construção. A palavra de origem africana, tem significado pejorativo – “ordinário”, “ruim” – e era a denominação que se dava aos trabalhadores que participaram da construção de Brasília. “Foi do Nordeste que saiu o retirante, fugindo da seca e da fome, para calejar as mãos na construção das riquezas de outras regiões”, define Divino Sobral.

Pinturas, colagens, intervenções fotográficas, instalação, técnicas e suporte diversos, todos criados em 2022, preenchem o espaço e contam a história da pesquisa do artista que, após uma imersão na região nordeste, virou seu foco para o planalto central. A tela “Eixo”, cinzenta como o cimento, faz alusão à primeira cicatriz do solo da nova capital deixada por Lucio Costa em 1956, quando fixou com uma cruz o encontro do Eixo Monumental com o Eixo Rodoviário, onde começam tanto a nova cidade como todo um processo que resultou em profunda transformação da região Centro-Oeste do país.

Com fotografias transpostas para uma superfície de concreto, Reynaldo Candia sobrepõe frases célebres que poderiam servir como uma segunda legenda, como em “Candangos construção”. O políptico, também “Candangos”, manipula pontos de vista lançados sobre a monumental escultura de Bruno Giorgi e o mesmo título se repete em um objeto, encapsulado por acrílico onde o livro “Candangos” é perfurado e nos orifícios são inseridos retratos de trabalhadores impressos em vermelho. Já em “Antes, antes”, uma fotografia é perfurada por círculos que funcionam como molduras para outras imagens com detalhes arquitetônicos da cidade.

Reynaldo Candia –
“Primeiro Item”, 2022 – Técnica: concreto, livro e lente – 40 x 30 x 35 cm.

“A grande Terra vermelha” exibe um mapa do Brasil executado com terra extraída do solo da cidade e posto em posição invertida, o que provoca um certo desconforto no olhar e sugere questionamentos. Duas obras que retratam a ausência e a incompletude – “Aqui não tem sudeste nem sul” e “Pau-brasil” – representam o mapa do Brasil por meio da união de técnicas de pintura agregada à apropriação de objetos. Enquanto a tela em óleo “Aqui não tem sudeste nem sul” é formada por um fragmento do mapa com as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, “Pau-brasil” é um trabalho tridimensional com uma prancha da madeira título perpendicular à parede como suporte às capas de livros de história sobre as quais está pintado o mapa brasileiro. “São obras que tratam do esvaziamento da historiografia oficial e da necessidade de reescritura da história, em observância ao narrar do vencido e não do vencedor, como é habitual”, diz Divino Sobral.

“Viramundo” oferece um mapa onde tanto a região Nordeste como a palavra do título surgem pintados com a mistura de cimento, pigmento e tinta acrílica aplicada sobre um suporte de madeira. Para “História”, com exemplares da enciclopédia Delta dedicados à história geral ou à história do Brasil, uma intervenção de recortes redondos escavados nas capas e nos miolos dos livros resultam em uma movimentação visual sugerindo acesso ao conteúdo a partir de pontos pré-definidos. “Lacre” e “Torre” são trabalhos que possuem livros vedados no interior de placas de concreto simbolizando as ideias que havia no período da ditadura. Já em “Memória”, reúne um grupo de livros didáticos que funcionam como base de sustentação do mastro que ergue a bandeira nacional, confeccionada em feltro com cores acinzentadas

“(….) as obras de Reynaldo Candia têm a ousadia de firmar posição de crítica ao fascismo e ao conservadorismo, e de fazer compromisso com a defesa dos valores que garantem a liberdade política, o futuro da juventude e o crescimento da justiça social do País”.  Divino Sobral

“A quem interessa um país sem memória?” – Reynaldo Candia.

Serviço:

Exposição “O concreto já rachou!”

Artista: Reynaldo Candia

Texto Crítico: Divino Sobral

Abertura: 16 de julho, sábado, das 14h às 18h

Período: de 18 de julho a 13 de agosto de 2022

Local: Belizário Galeria – R. Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, 491 – Pinheiros – São Paulo (SP)

Telefone: (11) 3816-2404

Horários: de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h; sábado das 11 às 15h

Número de obras: 35

Técnica: pintura, colagem, corte, serralheria, alvenaria, costura, instalação

Dimensões: de 30 x 20 cm a 300 x 50 cm

Preço: sob consulta

Site: https://belizariogaleria.com.br/

Instagram: @belizariogaleria

Facebook: @BelizarioGaleria

E-mail: contato@belizariogaleria.com.br

O artista Reynaldo Candia (São Paulo, SP 1975)

Bacharel em História da Arte e Comunicação visual. Realizou cursos no MASP e Tomie Ohtake, dentre outros, e frequentou ateliês como assistente. No seu trabalho usa objetos em acúmulos ou camadas, passando por fotografia, colagem, instalações e pintura. Participou de diversas coletivas, editais e salões; entre eles, o Abre-Alas na Gentil Carioca, programa de exposições no MARP e Novíssimos no IBEU. Foi Premiado em vários salões dentre os quais 43º Salão de Santo André, SP; 17º Salão de Pequenos Formatos – UNAMA, PA; 11ª Bienal do Recôncavo, BA; 10º Salão Latino-Americano, Santa Maria, RS. Participou da residência artística na Bienal de Cerveira, Portugal (2012 e 2018) e na Dinamarca, em 2016, onde possui obras em seus acervos. Em seus trabalhos, desde o início da carreira procura desviar a intenção primaria do bidimensional, sendo assim vem trabalhando com diversos suporte e mídias. A acumulação, a repetição e a materialidade interessam muito para a construção de camadas e campos onde os posiciona seguidamente, seja retirando material, como no caso dos livros, ou colocando uns em cima dos outros, como é o caso do baralho. Atualmente vem executando esse “modus operandi” pela pintura. As camadas vão se sobrepondo através de grande volume material e cores.

(Fonte: Balady Comunicação)