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SESC Niterói recebe exposição “Monolux” do fotógrafo Vicente de Mello

Niterói, por Kleber Patricio

Vicente de Mello – “Carbono 14 teste II” – série “Monolux”, 2016.

No dia 3 de junho, o SESC Niterói inaugura a exposição “Monolux”, com 32 fotogramas recentes e inéditos do fotógrafo Vicente de Mello produzidos sem câmera e sem negativo, por meio do contato de objetos com a superfície do papel fotográfico. Com curadoria do poeta Eucanaã Ferraz, a mostra, uma das selecionadas no Edital de Cultura SESC RJ Pulsar 2021/2022, reúne imagens únicas produzidas nos últimos seis anos, em um processo que remonta à origem da fotografia e vai na contramão da grande reprodutibilidade de imagens digitais dos dias atuais.

A exposição chega ampliada ao SESC Niterói, com obras inéditas, depois de ter sido apresentada no MAM-Rio, em 2018. No dia da abertura será realizada uma visita guiada com o artista e o curador, que também farão uma palestra no dia 13 de julho, quando será lançado o e-book da exposição. Ao longo de toda a mostra, serão realizadas visitas mediadas com arte-educadores, de terça a sábado, das 10h às 16h.

Apesar de utilizar um procedimento histórico, no qual objetos são colocados sobre papel sensibilizado quimicamente, que, ao serem expostos à luz, revelam a silhueta branca do objeto em um fundo escuro, Vicente de Mello dá um caráter pessoal a essa técnica.  “Em vez de arranjos estritamente formais ou de avizinhamentos aleatórios, cria ‘relâmpagos narrativos’. Iluminações. Imagens que, não sendo literárias, ou literais, guardam fragmentos narrativos em sua origem, reduzidas ao mínimo, à condição de peças de um jogo. Especificamente, de um jogo da memória”, afirma o curador Eucanaã Ferraz no texto que acompanha a exposição.

Vicente de Mello – “Astro Nau” – série Monolux”, 2021.

Objetos simples do cotidiano, como madeiras, álbuns, câmeras, slides, porta-retratos, tampinhas de garrafa e até nós de aço da operação cardíaca de seu pai, são utilizados para criar as formas gráficas das imagens, em obras que fazem não só uma homenagem à fotografia, mas também à história da arte, com fotogramas em alusão a artistas como Lasar Segall (1889-1957), Oscar Niemeyer (1907-2012), Joaquim Torres Garcia (1874-1949) e Édouard Manet (1832-1883).

Fotograma x Digital

Diante da enorme quantidade de imagens digitais da atualidade, Vicente de Mello buscou mostrar nesta exposição a natureza primeira da fotografia: os fotogramas, “uma antítese do impalpável e imensurável universo de pixels”. O fotograma surgiu na primeira metade do século XIX, com o inglês William Talbot (1800-1877), pioneiro da fotografia, sendo reapropriada pelo norte-americano Man Ray (1890-1976) no século XX, que deu a ela o nome de Rayograph.

Ao contrário das imagens digitais, que podem ser manipuladas, com os fotogramas não há como ter total controle sobre a impressão. “Agradava-me a ideia de pensar que tanto a luz quanto os objetos exercem uma ação tátil de clara composição ambígua sobre o papel, resultando em um fato fotográfico de força enigmática”, explica Vicente de Mello, ressaltando que “todas as modulações, tentativas e acidentes foram às cegas”.

Vicente de Mello – “Marco Zero – para Daiana” – série Monolux”, 2017.

Sobre retomar uma técnica do início da fotografia em meio às novas tecnologias do século XXI, o artista afirma: “No meio da constatação desta espetacular hecatombe de imagens, senti que eu mesmo já estava há anos convivendo com um grande manancial de imagens editadas, conhecidas, exibidas, adquiridas, publicadas, além das arquivadas que nunca chegaram a outros olhos”, conta Vicente de Mello. “Essas imagens formavam o ‘cosmos’ da minha propriedade como autor, ainda a ser descoberto e revisto em múltiplas análises, recortes e inserções”. Ele ressalta que não considera ter esgotado sua percepção, mas que precisava “retornar a um pensamento em que pudesse construir, dominar, e que ele fosse único, sem a possibilidade de estar, enquanto original, em vários lugares. Um novo estatuto da fotografia, sem freio”, afirma.

Monolux

O título da exposição, “Monolux”, vem da lembrança de Vicente de Mello do nome de um telescópio japonês de uso amador dos anos 1970 e “pelo fato físico de que, para imprimir os fotogramas, uma única fonte de luz é utilizada: a lâmpada da cabeça do ampliador. Os fotogramas abandonam a materialidade do negativo, para lidar com a materialidade da luz, e a experimentação é a força orientadora, a âncora na imaterialidade da imagem”, diz.

De acordo com o artista, as proposições de seus fotogramas baseiam-se em duas interpretações – uma na literatura italiana e outra na brasileira:

“Umberto Boccioni (1882-1916), que desde o texto do manifesto técnico da pintura futurista, afirmava que era fundamental estabelecer uma relação de complementariedade entre a observação do mundo fenomênico, o indelével que só existe em nossa mente e o que se manifesta por meio da recordação. A meu ver, ele queria atribuir importância à capacidade de se recorrer às recordações individuais, e por meio da intuição e estado da alma constituir o fazer artístico”.

“A outra interpretação de que gosto é a uma fala em ‘Grande sertão: veredas’, de Guimarães Rosa (1980-1967) que contextualiza as referências das imagens dos meus fotogramas: “O que lembro, tenho! A realocação dos objetos no pré-table top foram fundamentais para transcender o representado, o que via na composição realizada a olho nu, das imagens que tinha em mente, não eram o resultado em preto e branco, após o laboratório. Olhava para as composições e pensava: ‘vocês perderão a posição de protagonistas e entrarão em uma atmosfera de cumplicidade’”.

Sobre o artista

Vicente de Mello é fotógrafo e ensaísta. Formado em Comunicação Social pela Universidade Estácio de Sá, possui especialização em História da Arte e Arquitetura no Brasil, pela PUC. Trabalhou no Departamento de Fotografia do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (1989-1998). Desde 1990, produz obras que refletem sobre a tradição histórica de reflexão sobre o meio fotográfico, criando um léxico visual estilístico de inversão de significados, gerando dúvida sobre a presença das coisas, por uma transvisão dos códigos da linguagem fotográfica, destacando-se as séries “Topografia Imaginária” (1994-1997), “Vermelhos Telúricos” (2001-2016), “Galáctica” (2000-2016), “Lapidus” (2013-2018), “Silent City” (2013) e  “Brasília utopia lírica” (2014), entre outras.

Ganhou o Prêmio de Melhor Exposição de Fotografia do Ano em São Paulo, da Associação Paulista de Críticos de Arte, com a mostra “moiré.galáctica.bestiário/Vicente de Mello– Photographies 1995-2006” (Pinacoteca do Estado, 2007) e foi o primeiro brasileiro a ser convidado para uma residência artística no Espace Photographie Contretype (Bruxelas, Bélgica, 2013).

Entre as exposições mais recentes, estão “Pli selon pli” (SESC 24 de maio, São Paulo, 2017), a individual “Monolux’, com curadoria de Eucanãa Ferraz (Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro, 2018), e “Limite Oblíquo”, no Paço Imperial, em 2021, com curadoria de Aldones Nino.

Serviço:

Exposição Vicente de Mello – “Monolux”

Exposição: até 6 de agosto de 2022

De terça a sábado, das 10h às 16h

SESC Niterói [Galeria de Arte]

Endereço: Rua Padre Anchieta, 56 – São Domingos – Niterói – RJ

Telefone: (21) 4020-2102 – Telefone do SESC – (21) 2704-2876

Entrada gratuita

Curadoria: Eucanaã Ferraz

Produção: AREA27.

(Fonte: Midiarte Comunicação)